Podemos concluir que a Idade Moderna representou a transição do sistema feudal
ao Capitalismo contemporâneo e o Estado Nacional Absolutista representou a
expressão do poder indireto da burguesia, ao mesmo tempo em que mantinha os
privilégios da nobreza. Naquele momento, segundo o historiador Leo Huberman
(História da Riqueza do Homem), “a burguesia era semelhante a um pintinho
dentro do ovo prestes a nascer. Ele tem duas opções, ou rompe a casca ou morre
sufocado (...)”. No século XVIII, o antigo regime poderia ser representado por
esta casca a qual Huberman se referiu em sua comparação – ele era um entrave à
expansão da riqueza e do poder burguês, assim como seu desdobramento nas
colônias, o antigo sistema colonial.
A independência dos Estados Unidos inaugurou uma nova etapa da história. A
Revolução Industrial (1760) e a Revolução Francesa (1789-1799) coroaram um
período de transformações radicais.
O primeiro sinal de ruína do Antigo Regime foi o rompimento das colônias
norte-americanas com a metrópole inglesa. O fim do Pacto Colonial evidenciou as
novas práticas econômicas que seriam agora adotadas, influenciadas pelo
Iluminismo e pelo Liberalismo. A consolidação do Estado burguês virá com a
Revolução Francesa e a nova divisão do trabalho se consolidará com a Revolução
Industrial.
As treze colônias e seu processo de
independência
Durante grande parte do período em que a Inglaterra exerceu domínio sobre a
América Anglo-Saxônica, o Pacto Colonial não se caracterizou pela extrema
rigidez imposta por outros paises a outras áreas coloniais. De fato, as Treze
Colônias não representavam o total interesse da Inglaterra na América e segundo
Eduardo Galeano, “era mais importante para a Inglaterra uma ilhota no Caribe do
que as colônias da costa leste da América do Norte” (As Veias Abertas da
América Latina).
A colonização de povoamento, aliada à política de tolerância adotada pela
Inglaterra, propiciou às colônias do Norte e do Centro um desenvolvimento
autônomo, cuja economia era baseada no comércio e produção de manufaturas. As
colônias do Sul, que praticavam a economia agroexportadora, sobretudo de
algodão, eram rigidamente controladas pelas regras do Pacto Colonial, embora
durante o século XVII os problemas internos vividos pela Inglaterra tivessem
dificultado o processo de fiscalização.
Após a Guerra dos Sete Anos (1756-1763) com a França, a economia da Inglaterra
encontrava-se seriamente abalada. Apesar da vitória inglesa na guerra, impondo
à França perdas de territórios coloniais como o Canadá e a Índia, o conflito
repercutiu negativamente nas finanças da Grã-Bretanha; tornou-se necessário
recuperar o prejuízo.
Como era habitual no comportamento metropolitano, a Coroa Inglesa resolveu se
socorrer de suas colônias para recuperar a economia. Londres restringiu a liberdade
econômica das suas colônias na América do Norte, arrochando o Pacto Colonial.
O arrocho colonial
O Parlamento Inglês decretou uma série de impostos coloniais a fim de aumentar
a arrecadação. As principais leis de impostos coloniais foram:
· 1764 – Sugar Act (Lei do Açúcar): todo açúcar não oriundo das Antilhas
Britânicas seria altamente taxado. Afetava principalmente os contrabandistas
que atuavam no comércio triangular, envolvendo o Caribe Espanhol (Cuba), a
costa da Nova Inglaterra e a África.
· 1765 – Stamp Act (Lei do Selo): incidia sobre livros, jornais e documentos
publicados na colônia, que teriam de receber o selo da Coroa e o valor seria
incorporado ao preço.
Essas leis fizeram com que os colonos exigissem representatividade junto ao
Parlamento Britânico para defender seus interesses. A pressão colonial, aliada
à atuação de parlamentar William Pitt, fez com que o Stamp Act fosse revogado.
Em 1766, no entanto, as relações entre as Treze Colônias e a metrópole já
estavam comprometidas.
Em 1767, o Parlamento, através do então Primeiro Ministro, Towshend, retomou o
arrocho colonial. A reação na colônia foi imediata, colocando em confronto os
colonos e o exército inglês. Em Boston, uma manifestação acabou sendo
tragicamente dispersada pelos canhões britânicos e o episódio ficou conhecido
como o Massacre de Boston (imagem abaixo) devido à violência das tropas metropolitanas.
Com os ânimos exaltados, a Inglaterra decidiu diminuir o arrocho. Contudo, em
1773, a situação volta a se agravar com a decretação de mais uma lei, o Tea Act
(Lei do Chá). Por esse decreto, o comércio de chá nas colônias ficou sob
monopólio da Companhia das Índias Orientais, controlada por comerciantes
metropolitanos. O monopólio da Companhia prejudicava os comerciantes da colônia
que ficaram proibidos de comercializar o chá.
Na noite de 16 de dezembro de 1773, em resposta ao Tea Act, colonos disfarçados
de índios atacaram três navios da Companhia no porto de Boston e jogaram a
carga de chá no mar. Esse episódio foi denominado Boston Tea Party (Festa do
Chá de Boston). A situação ficava cada vez mais insustentável e já se
evidenciava o processo de ruptura colonial.
Havia um sentimento generalizado na sociedade norte-americana em favor da
autonomia frente à metrópole, mas esse sentimento tinha gradações
diferenciadas, que se polarizavam em dois grupos: conservadores e radicais.
· Conservadores. Formado principalmente pelos grandes proprietários rurais do
Sul e grandes comerciantes do Norte e do Centro, ou seja, era a aristocracia
rural e a alta burguesia. Queriam o fim da excessiva exploração metropolitana,
mas tinha medo da instalação de um governo que tivesse a participação das
camadas populares, o que poderia significar o fim de seus privilégios.
· Radicais. Grupo formado pelos pequenos proprietários, pequenos comerciantes,
trabalhadores livres e pessoas que defendiam os ideais iluministas. Defendiam a
ruptura definitiva com a Inglaterra, a criação de um governo que atendesse às
necessidades da maioria, os valores democráticos, a igualdade política entre
todos os cidadãos e a igualdade de oportunidades. Foram os fundadores dos
valores patrióticos característicos da sociedade norte-americana.
É necessário entender que os valores democráticos defendidos pelos radicais não
se estendiam a toda a população dos Estados Unidos. Eles entendiam como
cidadãos, ou seja, aqueles que têm direitos políticos, apenas a população
masculina, branca e de origem anglo-saxônica. As mulheres, a população indígena
e os afro-americanos ficavam de fora dos ideais de igualdade e de liberdade
(sobretudo os afro-americanos escravizados).
Os radicais reuniam-se em organização que tinham a função de ordenar as ações
populares contra os abusos da metrópole. Estima-se que havia centenas de
organizações desse tipo, espalhadas por várias colônias, atuando em conjunto ou
separadamente. A mais conhecida dessas organizações era a Filhos da Liberdade.
Essas associações conferiram ao processo de independência dos Estados Unidos em
caráter muito popular, fato que é comemorado até os dias de hoje por aquele
povo.
A guerra de independência
Uma série de medidas retaliadoras tomadas pela metrópole, em 1774, para
responder às manifestações coloniais, ficaram conhecidas como Leis Intoleráveis :
- fechamento do porto de Boston,
- exigência de indenização pela perda da carga de chá
- ocupação militar da colônia de Massachussets
Em setembro de 1774, os colonos se reuniram no Primeiro Congresso Continental
da Filadélfia, onde decidiram boicotar economicamente a Inglaterra enquanto
vigorassem as Leis Intoleráveis. Essa decisão teve o efeito de uma declaração
de guerra. O governo inglês mobilizou suas tropas em direção a colônia
rebelada; os colonos se armaram para resistir ao avanço metropolitano. Em 1775,
Lexington e Concord foram atacadas pelas tropas inglesas, o que determinou o
início da guerra de independência.
O conflito armado começou em abril de 1775, e deixou claro aos colonos que
havia a necessidade de uma organização militar de grande porte para fazer
frente ao exército inglês. Thomas Jefferson e Dickinson redigiram um documento
intitulado “Declaração sobre os Motivos e a Necessidade de Pegar em Armas”, no
qual ficava clara a forma de reação dos colonos. O comando das operações
militares foi entregue a George WashingtonGeorge Washington, um conservador do Sul, capaz de
impor confiança aos grandes proprietários sempre temerosos de que o conflito
colocasse em risco seus bens.
É necessário entender que, antes do inicio da guerra, os habitantes das
colônias da América do Norte entendiam que eram ingleses, assim como as pessoas
que moravam aqui no Brasil entendiam que eram portuguesas, uma vez que a
colônia era uma extensão do território metropolitano além-mar. Foi necessária
uma grande doutrinação para que os colonos passassem a pensar em si próprios
como americanos, e não como ingleses, caso contrario corria-se o risco de um
retrocesso no processo de independência. Por isso, faz parte da luta de
independência norte-americana uma vasta literatura escrita pelos lideres do
movimento, que tinha a função de realizar essa doutrinação.
Talvez o mais importante documento com esse caráter tenha sido o panfleto
escrito por Thomas Paine em janeiro de 1776. O pequeno texto, intitulado “Senso
Comum”, argumentava que uma ilha (Inglaterra) não devia governar um continente
(América do Norte) e expressava com clareza a idéia de independência. O
panfleto de Paine colocava para as pessoas comuns de forma clara e direta as
idéias de liberdade que os radicais já discutiam há anos. Seu efeito foi
imediato e arregimentou grande número de populares para a luta. A pressão
popular obrigou os conservadores, ainda reticentes quanto à ruptura com a
Inglaterra, a se colocarem a favor da independência.
No Segundo Congresso Continental da Filadélfia ficou decidida a ruptura com a
metrópole. Thomas Jefferson, com a colaboração de Benjamin Franklin, Roger
Sherman, John Adams e Robert Livingston, escreveu a Declaração de Independência, que foi aprovada pelo Congresso no dia 4 de julho de 1776. A
declaração de independência afirmava: “Consideramos como uma das verdades
evidentes por si mesmas que todos os homens são criados iguais; que receberam
do seu criador certos direitos inalienáveis, entre os quais figuram a vida, a liberdade
e a busca da felicidade; que os governos que foram estabelecidos precisamente
para manter esses direitos, e que seu legitimo poder deriva do consentimento de
seus governados; que cada vez que uma forma de governo se manifesta inimiga
desses princípios, o povo tem o direito de mudá-la ou suprimi-la e estabelecer
um novo governo, baseando-se naqueles princípios e organizando seus poderes
segundo formas mais apropriadas para garantir a segurança e a felicidade. A
prudência exige que os governos estabelecidos desde muito tempo não devem ser
modificados por motivos fúteis e passageiros [...] Mas quando uma série de
abusos e usurpações convergem invariavelmente para o mesmo fim e demonstram o
objetivo de submeter o povo a um despotismo absoluto, é direito do povo, e até
seu dever rejeitar tal governo e buscar novas garantias de sua segurança
futura. Tal é a situação das colônias agora, e daí a necessidade que as obriga
a mudar seu antigo sistema de governo”. (GRIMBERG, Carl. História universal.
V.10, p.39).
A Guerra de Independência se estendeu até 1783. O apoio francês, que buscava
reconquistar as terras perdidas na Guerra dos Sete Anos, foi conseguido por
Benjamin Franklin após a vitória dos colonos em Saratoga (1777). Em 1781 os
ingleses se renderam em Yorktown e em 1783 foi assinado o Tratado de Paris,
reconhecendo a independência da primeira República da América.
Pela primeira vez foi formado em governo estruturado de acordo com os
pressupostos do Iluminismo. Essa forma de Estado se organizava a partir de uma
nova relação entre o governante e a nação; as pessoas deixavam de ser súditos
submetidos à vontade do governante e passavam a ser cidadãos com poderes para
destituir o governo caso este não estivesse zelando pelo bem-estar da maioria.
Mas não devemos nos esquecer de que, no final do século XVIII, esses
privilégios ainda eram restritos apenas a uma parcela da sociedade (homens
adultos, brancos e de origem anglo-saxônica).
A consolidação da República veio em 1787 com a promulgação da Constituição, de
caráter federalista e presidencialista, com separação dos três poderes. George
Washington foi escolhido pelo Congresso para ser o primeiro presidente dos
Estados Unidos.
A emancipação dos Estados Unidos reforçou os ideais de independência na América
Latina, agravando a crise do Antigo Sistema Colonial.
A expansão territorial e a consolidação dos EUA (século XIX)
Com a organização da República, os Estados Unidos iniciaram sua expansão
territorial ainda no século XVIII. A jovem nação tornou-se um pólo atrativo
para a imigração européia, pois viveu em amplo desenvolvimento econômico.
A imigração foi um dos principais fatores da expansão territorial dos Estados
Unidos. Comprimidos entre os Montes Apalaches e o Oceano Atlântico, contando
com a chegada sistemática de novos habitantes, era necessário buscar novas
fronteiras. Estas se encontravam a Oeste e eram formadas por terras ocupadas
pela população indígena.
Os conflitos napoleônicos do início do século XIX beneficiaram o comércio
externo norte-americano. A Inglaterra não enxergou com bons olhos o crescimento
comercial dos Estados Unidos e a aproximação destes com a França Napoleônica.
Entre 1812 e 1814, ocorreu um novo conflito armado entre Estados Unidos e
Inglaterra, que foi denominado de a Segunda Guerra de Independência.
O conflito não teve conseqüências sérias e terminou com a assinatura de um
tratado de paz (Paz Eterna de Gand), mas serviu para despertar o sentimento
nacionalista. A necessidade de manutenção da unidade nacional e territorial e
as constantes ameaças de uma recolonização, ou mesmo de uma intervenção armada
por parte das potências européias, desenvolveu o pensamento isolacionista
norte-americano. Em 1823 era divulgada a Doutrina Monroe, determinando que os
Estados Unidos não iriam se envolver nos assuntos internos da Europa mas, em
contrapartida, não aceitariam a intervenção dos europeus nos assuntos
americanos. O lema dessa política era “América para os americanos”.
No início do século XIX os Estados Unidos se lançaram na Marcha para o Oeste,
comprando ou anexando territórios e ampliando sua extensão geográfica. Durante
esse processo ocorreu uma verdadeira guerra entre norte-americanos e índios,
que resultou no genocídio das populações nativas e na ocupação de suas terras
pelos colonos.
A partir da costa do Atlântico, a expansão territorial atingiu a costa do
Pacífico em 1846, fazendo o novo país atingir dimensões continentais. Observe
as etapas dessa expansão:
· 1803 – A Lousiania é comprada de Napoleão Bonaparte;
· 1819 – A Flórida é adquirida junto à Espanha;
· 1846 – Anexação do Oregon. Chegada ao litoral do Pacífico;
· 1848 – Numa guerra contra o México, os Estados Unidos incorporam dois milhões
de quilômetros quadrados, atingindo o Pacífico. Pelo tratado de
Guadalupe-Hidalgo foram anexadas Texas, Califórnia, Novo México, Utah, Nevada e
Arizona; “Pobre México: tão longe de Deus, tão próximo dos Estados Unidos!”.
· 1867 – O Alasca é comprado da Rússia;
· 1896 – O Havaí é invadido e anexado.
A expansão foi justificada pela Doutrina do Destino Manifesto, segundo a qual
“os norte-americanos foram escolhidos por Deus para liderar a América e o
mundo”.
O caráter capitalista da expansão era claro e a partir da Florida foi possível
alcançar a América Latina e, através do Pacífico, os mercados orientais da
China e do Japão.
a) Compra de Territórios e diplomacia.
Pelo Tratado de Versalhes, 1783, firmado com a Inglaterra, o território dos Estados
Unidos abrangia da Costa do Atlântico até o Mississipi.
No século XIX, essa realidade se altera consideravelmente. Em direção ao Oeste
aparece o território da Louisiana, colônia francesa, que Napoleão Bonaparte -
devido às guerras na Europa e Antilhas, Haiti - negociou com os
norte-americanos por 15 milhões de dólares (1803). A Flórida foi comprada dos
espanhóis, em 1819, por cinco milhões de dólares. A Rússia vendeu o Alasca aos
Estados Unidos por sete milhões de dólares. A anexação de Óregon - Noroeste -,
colônia inglesa, região que despertou pouco interesse até 1841, foi cedida aos
americanos em 1846.
b) Guerra.
O Sudoeste americano pertencia ao México. A conquista desse território ocorreu
através da guerra. Em 1821, os colonos americanos passaram a colonizar esse
território com autorização do governo mexicano que exigiu-lhes a lealdade e a
adoção da religião católica por parte dos pioneiros. A dificuldade encontrada
pelo México na consolidação do Estado Nacional refletiu-se em conflitos
internos e no estabelecimento de ditaduras, como a de Lópes de Sant'anna. Esses
fatos impediram um efetivo controle sobre essa região, outrora concedida. Dessa
maneira, o Texas estava fadado a compor os Estados Unidos, o que ocorreu em
1845, quando os colonos norte-americanos ali estabelecidos declararam a
independência do território em relação ao México e a sua incorporação aos
Estados Unidos.
A guerra estendeu-se até 1848, quando foi assinado o Tratado de
Guadalupe-Hidalgo, que estabelecia o Rio Grande como linha fronteiriça entre o
México e o Texas, além da cessão da Califórnia, Arizona, Novo México, Nevada,
Utah e parte do Colorado aos Estados Unidos, por 15 milhões de dólares.
Em 1853, foi completada a anexação de territórios do México com a incorporação
de Gadsden. Metade do território mexicano havia sido perdida para os Estados
Unidos. Lázaro Cárdenas, presidente mexicano (1934-1940), em relação ao
imperialismo norte-americano comentou: "Pobre México, tão longe de Deus e
tão perto dos Estados Unidos".
d) A guerra de extermínio contra os indígenas.
As maiores vítimas da marcha para o Oeste foram os indígenas. Estes
encontravam-se em estágios de pouco desenvolvimento se comparados aos astecas,
maias e incas, daí sua dificuldade para resistir ao domínio e força dos brancos
europeus.
Os norte-americanos acreditavam que, além de serem os predestinados por Deus a
ocuparem todo o território, deveriam cumprir a missão de civilizar outros
povos.
As tribos do Sul, mais desenvolvidas, proporcionaram uma resistência maior à
ocupação do branco. No entanto, a única opção das tribos indígenas foi a
ocupação de terras inférteis em direção ao Pacífico, até o seu extermínio.
Hoje, os remanescentes desses povos vivem em reservas indígenas espalhadas pelo
país.
Os Estados Unidos conheceram dois tipos de colonização: no Sul foi estabelecida
a plantation, trabalho escravo e produção voltada para o mercado externo; no
Norte ocorreu à colonização de povoamento, com o uso de pequenas propriedades,
trabalho livre e produção voltada para o mercado interno. Após a independência,
as duas regiões mantiveram-se no mesmo sistema econômico que praticavam no
período colonial.
Mas, na segunda metade do século XIX, o mundo passou a se organizar de acordo
com a Divisão Internacional do Trabalho. Essa nova forma de ordenação
internacional coloca, de um lado, os países industrializados, comercializadores
de excedente industrial e, de outro, os países não-industrializados, de
economia primária, fornecedores de matérias-primas e de produtos agrários e de
economia dependente. A regra geral é que do primeiro grupo façam parte os
países ricos enquanto os países pobres se aglutinem no segundo grupo.
Naquele momento histórico, uma boa parte das nações definia de que lado
ficaria. Para algumas nações essa situação já estava estabelecida. Por exemplo,
a Inglaterra, incontestavelmente, estava no grupo dos países ricos, enquanto o
Brasil, que havia optado por manter a economia agroexportadora, candidatava-se
a pertencer ao conjunto dos países de economia dependente. Porém, para os
Estados Unidos, essa questão estava em aberto porque em seu território
conviviam as duas propostas de política econômica: o Sul preferia manter a
economia agrícola destinada ao mercado externo, enquanto o Norte apostava na
industrialização e no desenvolvimento do mercado interno. A busca pela
definição do rumo econômico que o país deveria tomar foi o cenário onde se
desenrolou a Guerra Civil Norte-Americana, conhecida como Guerra de Secessão.
A questão alfandegária e a questão da mão-de-obra
Às vésperas da Guerra Civil, duas questões imediatas opunham o Norte e o Sul.
Em primeiro lugar, havia uma divergência com relação à política alfandegária.
Os estados do Norte queriam aumentar as taxas alfandegárias para proteger seus
produtos industrializados daqueles importados da Inglaterra. Os estados do Sul
eram contra a elevação dos impostos porque isso prejudicaria suas exportações
de algodão para as indústrias inglesas (a política alfandegária é uma via de
duas mãos: quando um país aumenta os impostos sobre os produtos importados, os
seus produtos passam a ser super-taxados pelos países que foram prejudicados
pela elevação alfandegária).
O segundo problema estava relacionado com o trabalho escravo, que ainda
predominava no Sul. Os estados do Norte eram claramente favoráveis à abolição
da escravidão por dois motivos: primeiro porque no sistema capitalista, como já
vimos, o trabalho deve se tornar uma mercadoria (na escravidão, o trabalhador é
que é a mercadoria); segundo, porque os ex-escravos poderiam formar um
expressivo mercado de mão-de-obra para as indústrias nortistas em expansão.
Quando, em 1861, Abraham Lincoln elegeu-se presidente apoiado em uma plataforma
que defendia a abolição da escravidão e o aumento das tarifas alfandegárias, os
estados do Sul decidiram separar-se (secessão) do Norte e formar um novo país.
Os estados do Norte, então, deflagraram a guerra não aceitando a divisão do
país porque os estados do Sul, representavam um mercado fornecedor de
matéria-prima e mão-de-obra e consumidor do excedente industrial.
O Norte venceu a guerra. Esse desfecho significou sobretudo, a vitória do
projeto da burguesia do Norte, ou seja, a expansão e consolidação do parque
industrial norte-americano, sua inserção no grupo dos países economicamente
desenvolvidos e que comandam a economia mundial. A partir desse crescimento
econômico, os Estados Unidos passaram a exercer uma política imperialista na
América Central, na América do Sul e nas ilhas do Oceano Pacífico. Assim, “A
vitória do norte em 1865 assegurou a continuidade do crescimento dos Estados
Unidos como nação. A décima quarta emenda à constituição declarava
expressamente que todos eram cidadãos dos EUA, e não de um determinado estado
ou território. Ao afirmar que nenhum cidadão poderia ser privado da vida, da
propriedade ou da liberdade sem o devido processo legal, estabeleceu que o
“devido processo” seria definido pelo governo nacional e não pelos governos
estaduais ou territoriais. Os anos que se seguiram à guerra civil americana
assistiram a consolidação econômica do país, sob direção da empresa privada
nortista. O símbolo do triunfo do Norte como formador da nação sobreveio com o
assentamento do ultimo trecho dos trilhos da estrada de ferro Union Pacific,
uma ferrovia transcontinental, em 1869. (...) A formação nacional, por seu
turno, produziu uma unidade econômica suficientemente grande para gerar os
meios com os quais sustentar o crecimento econômico; e suficientemente
confiante para que entrasse em concorrência com a Inglaterra.”. (Adaptado de
BURNS, EDWARD McNALL. História da Civilização ocidental: do homem das cavernas
as naves espaciais / EDWARD McNALL BURNS, ROBERT E. LERNER, STANDISH MEACHAM;
São Paulo: Globo, 2003, p.596).
A vitória do Norte unificou economicamente o país em torno do projeto
industrial, mas não foi capaz de eliminar diferenças regionais. Uma grande
parte dos sulistas jamais aceitou a abolição da escravidão imposta pelos
ganhadores da guerra. Sobretudo, não aceitaram a transformação dos ex-escravos
em cidadãos norte-americanos. Sem poder se voltar contra aqueles que lhes
impuseram essa situação, voltaram-se contra a população negra, praticando um
dos mais ferozes racismos de que temos conhecimento.
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